Odara e organizações parceiras encerram atividades do ano do Programa Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar
Texto e fotos: Alane Reis
Na manhã do último domingo (17) a equipe do Instituto Odara esteve reunida com as organizações parceiras e com as mulheres que integram o programa Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar, moradoras dos bairros do Uruguai, Nordeste de Amaralina, Cabula e Subúrbio Ferroviário de Salvador, bairros atendidos pelo programa. O encontro aconteceu na sede do Centro Cultural Alagados, no Uruguai, e teve como objetivo avaliar as ações de 2017 e pensar as perspectivas para 2018.
A atividade começou com um café da manhã, seguido por apresentação do coral de Mulheres de Alagados, composto por mulheres de várias organizações, e mães ou familiares de vítimas do Estado. “Encontrar minhas companheiras dois dias da semana para cantar é esquecer um pouco os problemas, pensar que a vida pode ser bonita, é bonita e é bonita, como diz a música”, conta uma delas. O coral é uma das atividades terapêuticas psicossocial, desenvolvida pelo programa, no bairro do Uruguai, em parceria com o Centro de Arte e Meio Ambiente (Cama).
Na sequência foi o momento de avaliação das atividades e perspectivas de 2018, com falas das mulheres que integram o programa, e das organizações parceiras, o Cama e Odeart. As mulheres do Cabula apresentaram os produtos das aulas de artesanato e as roupas produzidas nas aulas de costura. Ambos os cursos são realizados também com fins de cuidado psicossocial, pelo Minha Mãe Não Dorme, em parceria com o Odeart, no bairro do Cabula.
Janice de Sena, integrante do Odeart, fala sobre a importância das atividades: “A partir do argumento da costura, do artesanato, nós, mulheres, nos encontramos para falar das nossas angustias, das nossas expectativas, dores, traumas. Porque a sociedade brasileira se sustenta pela força e pela dor das mulheres, principalmente de nós, mulheres negras”.
Na fala das mulheres, os depoimentos são de vidas atravessadas pelas violências mais diversas, marcadas pela ação do racismo, o sexismo e o silenciamento, ainda assim, o convívio entre elas é frutífero para alimentar sonhos individuais e coletivos, trazer à tona a necessidade do auto cuidado, e do cuidado com a outra, se fortalecer para a busca por justiça pelas vidas de jovens negros ceifadas pelo Estado ou pela negligência do mesmo.
Algumas mulheres, mesmo depois de perder um, as vezes dois filhos, ainda tem coragem de enfrentar o Estado, sob atuação da polícia, para defender sua família. “Dia desses tive que fazer um escândalo na rua, meu filho e meu neto estavam na moto, a polícia parou eles e queriam levar pro meio do mato e colocar meio quilo de droga em casa um. Eu gritei, chamei atenção da rua toda e por isso não levaram eles presos”. Relatos como este, de abusos e truculência policial fazem parte do cotidiano das periferias de Salvador, e por este motivo, iniciativas autônomas do povo e das comunidades negras, que visam denunciar e combater o racismo institucional são necessárias.
“Acreditamos que nós somos a solução dos problemas nas comunidades negras, na cidade de Salvador, no estado da Bahia e em nosso país, basta que os gestores, dirigentes e sociedade em geral acreditem e possibilite que nós mulheres, homens e comunidades negras, promovam a transformação. Para isto é fundamental que nos deixem viver”, Valdecir Nascimento, coordenadora executiva do Odara Instituto da Mulher Negra, durante a avaliação.
A psicóloga e parceira do Instituto Odara, Veridiana Machado, trouxe a provocação: “o que é uma assistência psicossocial para mulheres negras, vítimas de violências determinadas pelo racismo?”, e a partir daí ela falou da importância de pensarmos o cuidado psicológico individual e coletivo. “O Estado não está preocupado nem com a justiça, quanto mais com essa dor, por isso nós precisamos criar espaços efetivos de cura desta dor”.
No encerramento da atividade, Valdecir Nascimento falou como as avaliações apresentadas neste encontro irão orientar as ações do programa Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar, em 2018, e reforçou a importância do cuidado psicológico para todas as mulheres negras, especialmente às que tiveram filhos assassinados pela violência genocida anti negra do Estado brasileiro. “Nós mulheres negras somos a centralidade das nossas famílias, das nossas comunidades, independente de sofrer violência diretamente, precisamos nos cuidar, cuidar do psicológico, para continuar cuidando das nossas e dos nossos”.
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