#OpiniãoOdara – Agosto da Juventude: Entre a nossa luta pela vida e o projeto de morte do Estado

Por Redação Odara
Mês que deveria ser tempo de afirmação da vida, da esperança e dos sonhos, se tornou mais um calendário de mortes
O mês de agosto, instituído pela Organização das Nações Unidas como “Agosto da Juventude”, é dedicado a fortalecer debates e iniciativas sobre protagonismo social. Mas, neste ano, na Bahia, é impossível celebrar quando as vidas negras seguem sendo ceifadas. O que há para comemorar se o futuro é arrancado a tiros e, a cada semana, famílias são obrigadas a enterrar seus filhos, vizinhos e amigos?
Em agosto deste ano, jovens negros foram assassinados em diferentes cidades do estado. Cada nome, cada rosto, revela como o projeto de extermínio contra a juventude negra se manifesta de forma brutal e contínua.
Em Feira de Santana, na madrugada do dia 11 de agosto, um adolescente de 17 anos e um jovem de 25 foram mortos a tiros após a casa onde estavam ser invadida. As vítimas foram identificadas como Kauan da Silva Nunes da Costa e Carlos José Souza de Jesus. Segundo informações da Polícia Civil, eles foram atingidos com mais de dez tiros na cabeça e no tórax.
No dia 15 do mesmo mês, em Ilhéus, Mariana Bastos da Silva, de 20 anos, foi morta junto com a mãe, Maria Helena Bastos, e a amiga da família Alexsandra Suzarte ,Três mulheres negras foram executadas, em um crime que deixou a cidade em choque. Investigações apontaram suspeitos, prisões foram feitas, e houve até confissão reportada pela imprensa. Mas, ainda que se chegue a nomes oficiais e culpados, o que permanece é o padrão: mulheres negras, jovens e trabalhadoras, arrancadas da vida de forma violenta. Mariana tinha apenas 20 anos. É a juventude interrompida, é a vida que não terá tempo de amadurecer.
17 de agosto, em Salvador, no bairro de Castelo Branco, Pedro Henrique Santos Costa, de 16 anos, foi morto em um ataque a tiros em frente a um bar. Mais uma vez, a cena se repete: violência armada, ausência de proteção, e uma família negra devastada. Pedro tinha 16 anos. Adolescente, ele poderia estar sonhando com o vestibular, com o primeiro emprego, com a vida adulta.
Cinco dias depois, foi Ágatha Santana Pereira, de apenas 12 anos, quem tombou. A menina foi baleada a caminho da escola, em São Félix (BA). O percurso que deveria ser seguro e cotidiano se transformou em cena de violência e morte. Ainda não há respostas sobre a autoria ou motivação do crime. Enquanto isso, uma família chora e uma cidade se depara com a brutalidade de ver sua infância sendo ceifada. Ágatha deveria estar aprendendo, brincando, construindo seu futuro. Mas o racismo, que nega à infância negra o direito de ser criança, a marcou com uma bala.
No dia 23 de agosto, em São Gonçalo dos Campos (BA), cidade próxima a Feira de Santana, Mailson Borges Lopes, de 22 anos, foi assassinado. Ele havia participado de uma cavalgada e, ao retornar, foi alvo de tiros em uma emboscada. A polícia diz já ter indicativos de autoria. Mas, como sempre, o que permanece é o vazio: um jovem de 22 anos que já não terá tempo de realizar seus projetos e que não verá sua juventude florescer.
Marisol Batista de Jesus, jovem de 18 anos, foi morta a facadas pelo ex-namorado, que não aceitava o fim do relacionamento. O crime aconteceu na sexta-feira (29), no distrito de São Roque, que pertence ao município de Coaraci, no sul da Bahia.
No dia do crime, Mirasol esteve na delegacia da cidade para registrar um boletim de ocorrência e pedir uma medida protetiva contra o ex-namorado, Magno Araújo da Silva. Mas foi assassinada antes que a medida protetiva fosse deferida.
Esses são alguns dos casos que fazem parte de um projeto de morte que segue ativo e organizado. Um projeto que naturaliza que a juventude negra seja alvo de balas, que as mães negras sejam obrigadas a enterrar seus filhos, que a vida nos territórios periféricos e quilombolas seja marcada por luto.
O discurso oficial celebra agosto como o mês da juventude, mas de que juventude estamos falando? A juventude branca das propagandas governamentais, exibida como símbolo de esperança e futuro? Porque a juventude negra, periférica e quilombola segue sendo assassinada sem que políticas públicas reais sejam implementadas.
O racismo é a engrenagem que move essa máquina de moer corpos negros. O Estado é cúmplice quando não garante políticas de proteção, quando negligencia educação, cultura, esporte, trabalho, saúde mental e segurança. E é responsável direto quando age com violência, quando criminaliza, quando mata, quando deixa de investigar com seriedade.
Agosto, para nós, não é festa. É denúncia. É o mês em que gritamos mais alto para lembrar que a juventude negra tem direito de viver, de sonhar, de envelhecer. Que Mariana, Ágatha, Pedro, Mailson, Kauan, Carlos José e Mirasol não sejam reduzidos a estatísticas, mas que seus nomes ecoem como exigência de justiça e mudança.
Enquanto tentam nos enterrar em silêncio, nós seguimos lembrando, denunciando e lutando por nós, e pelos que virão.

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