Meninas e jovens da da Chapada Diamantina e de Salvador (BA) debatem dignidade menstrual e direitos reprodutivos em encontros formativos do Projeto Ayomide Odara

Rodas de conversa e oficinas práticas criaram espaços seguros para diálogo sobre corpo, saúde, autocuidado e o resgate de saberes ancestrais
Por Adriane Rocha – Redação Odara
O Projeto Ayomide Odara, iniciativa de formação política do Odara – Instituto da Mulher Negra voltada para meninas e adolescentes negras, intensificou seu cronograma de 2025 ao aprofundar o eixo temático sobre sexualidade e direitos reprodutivos.
Os encontros mais recentes focaram em criar espaços seguros para que as participantes discutissem temas importantes como dignidade menstrual, autocuidado, consentimento, prevenção de abusos e o fortalecimento da identidade negra e da autoestima.
No dia 13 de setembro, meninas negras de comunidades quilombolas do território da Chapada Diamantina participaram de um encontro que buscou abordar a primeira menstruação e a saúde integral. Em contextos onde a falta de informação adequada aumenta o risco de violência sexual, doenças e gravidez precoce, o Ayomide Odara atua como um facilitador de espaços educativos e acolhedores, permitindo que as meninas negras compreendam melhor seus corpos e suas escolhas.
Clara dos Reis, de 12 anos, da comunidade quilombola de Vazante, no município de Seabra (BA), destacou o impacto do diálogo: “É importante ser orientada e falar sobre a menstruação, porque não vou estar só. Vai ter outras meninas negras também que entendem sobre isso. Às vezes só se sabe sobre a menstruação e não sobre como se cuidar ou sobre os cuidados com nosso corpo.”
Débora Campelo, coordenadora pedagógica do projeto e ativista do Odara, pontuou que o encontro transcende o conhecimento biológico, configurando-se como um momento de reparação histórica. “Falar sobre direitos sexuais e reprodutivos é um processo de reparação. Criamos um espaço seguro para falar sobre consentimento, relações saudáveis e prevenção de violência, fortalecendo a autoconfiança e a identidade.”
A programação dos encontros incluiu rodas de conversa e oficinas práticas sobre absorventes de pano e descartáveis, abordando diferentes fluxos e produtos. Saberes ancestrais também foram incentivados, estimulando o diálogo com mães e avós sobre o manejo da menstruação e cólicas.
Para Mariah Silva Santos, 13 anos, da comunidade Quilombola de Boninal no município de Seabra, o aprendizado é vital para a autonomia: “Aprendi que posso cuidar do meu corpo, dizer não e escolher o que é melhor para mim. Toda menina da minha idade deveria saber disso.” Ela reforçou ainda o valor de estabelecer limites: “A oficina de corpo e cuidado me chamou muita atenção. A gente aprende que tem hora para tudo e que não precisamos ceder ao que outras pessoas esperam de nós.”
EM SALVADOR, OFICINAS REFORÇAM AUTONOMIA E SABERES ANCESTRAIS
Em Salvador, o encontro do Eixo de Saúde aconteceu no dia 27 de setembro e teve como foco o cuidado com o corpo, a consciência ambiental e o resgate de saberes ancestrais fortalecendo a promoção da dignidade menstrual e da saúde natural entre meninas negras.
A Turma 01, composta pelas Ayomides, de 8 a 13 anos, e a Turma 02, formada pelas Ayos da Escola Beatriz Nascimento (EBN), com idades entre 14 e 18 anos, participaram das oficinas de produção de absorventes de pano e de saboaria artesanal. O encontro também foi marcado por um momento de integração entre as duas turmas, que compartilharam reflexões, experiências e afetos, promovendo um potente intercâmbio de saberes e vivências.
Fátima Sequeira, facilitadora da oficina de absorventes e gestora da marca Flor de Maio, ressaltou o significado do momento: “Foi uma honra apresentar às meninas um conhecimento que vem das nossas avós. O absorvente de pano não é só uma escolha ecológica, é um instrumento de autonomia e cuidado ancestral. Quando uma menina aprende isso no início da menarca, ela já começa a trilhar outro caminho.”
Fernanda Santos, 13 anos, moradora de Salvador, relatou a mudança em sua perspectiva sobre consumo e menstruação: “Quando eu fiz meu próprio absorvente, entendi o quanto a gente polui com o descartável. O pano dura mais, é melhor para o corpo e para o meio ambiente. A gente achava caro, mas agora sei o valor do trabalho e por que vale a pena.”
Já a oficina de saboaria, facilitada por Leila Rocha, do Programa de Saúde do Odara, promoveu a integração entre saúde e educação: “Tivemos um encontro lindo, uma fusão entre os programas de saúde e educação do Odara. Conversamos sobre conhecer a vulva e fizemos um sabonete de calêndula, que traz à memória dos saberes das nossas mães e avós um cuidado que vai além do corpo, que também é espiritual.”
Endy Kethlen, 16 anos, participante da oficina, destacou o fortalecimento do autoconhecimento: “Aprendemos a fazer nosso próprio sabão natural e isso nos dá autonomia sobre o nosso corpo. Agora eu sei fazer algo que faz bem para mim, além de entender a importância do cuidado interno com os nossos órgãos, foi muito bom poder compartilhar com as meninas da minha idade sobre o cuidado que vem para além do autocuidado.”
O Projeto Ayomide Odara acompanha meninas negras em processos formativos que fortalecem seu protagonismo por meio da educação, valorização da identidade, resgate da memória e incidência política em seus territórios.
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