Mulheres Negras da América Latina, Caribe e África fortalecem mobilização e conexões políticas durante Conecta Latinas

Por Redação Odara*
O Odara Instituto da Mulher Negra, junto a outras 11 organizações de diversos países do Sul Global, compôs o comitê organizador do encontro Conecta Latinas, que ocorreu entre os dias 21 e 25 de maio em Recife(PE). A agenda foi idealizada e impulsionada pelo Instituto UpDate e contou com a participação de mais de 120 organizações da América Latina, Caribe e África, com o objetivo de criar conexões entre as iniciativas que trabalham em defesa da democracia e ampliação da participação política de mulheres e dissidências populares, afrodescendentes, indígenas, LBTQIA+ e jovens.
Pessoas de diferentes contextos e experimentações de enfrentamento ao colonialismo, colonialidade, racismo, capitalismo e patriarcado cis-heteronormativo tiveram a oportunidade de trocas. A programação contou com atividades de autocuidado, lazer, cultura, literatura, produção de conhecimento, troca de experiências e sustentabilidade financeira.
Valdecir Nascimento, idealizadora do Instituto Odara; Naiara Leite, coordenadora executiva do Odara; e Joyce Souza, coordenadora do Projeto Pretas no Poder: Participação Política, Representatividade e Segurança de Ativistas Negras, estiveram presentes e contribuíram com as discussões propostas, abordando, em especial, os debates sobre os conceitos de democracia, reparação e Bem Viver para as mulheres negras, destacando os caminhos para a construção da Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, que acontecerá em 25 de novembro de 2025, em Brasília (DF). Ativistas de outros movimentos de mulheres negras, como: Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB), Coletivo Nzinga, Coletiva Pretas de Angola, Fórum Nacional de Travestis e Transexuais (FONATRANS), que fazem parte dos Comitês de construção da Marcha, também trouxeram suas expectativas sobre a construção da segunda marcha.
O acolhimento e responsabilidade do Instituto UpDate em relação a incidência da Marcha de Mulheres Negras no Conecta Latinas foi elementar para ampliação da visibilidade; articulação de novas lideranças; e fortalecimento da capilaridade, em especial, do Comitê Global, com a garantia da participação de mais mulheres negras de países como Uruguai, Argentina, República Dominicana, Angola e Colômbia. Foi dado mais um importante passo para a mobilização e garantia de um milhão de mulheres negras em Brasília no dia 25 de novembro de 2025, impulsionadas também nesse encontro pelo desejo de um sistema político e uma sociedade construída e gerenciada por mulheres negras.

A partir de sistemas de valores que também sustentam o projeto do Bem Viver como a filosofia Ashanti e sua cosmovisão expressa nos símbolos Adinkras, as ativistas do Odara reafirmam: “O que nós queremos é mulheres negras no poder, construindo o Bem Viver!” Essa máxima tem guiado nossa presença nas ruas de Salvador (BA), na Marcha do Julho das Pretas; em espaços de imaginação e radicalidade como este; e seguirá conosco até Brasília, muito provavelmente com a primeira presidenta negra do Brasil entre nós”, destacou Joyce Lopes. Mas não se trata apenas de celebrar o ineditismo. O movimento de mulheres negras acredita que esta presidenta está sendo forjada, com sua candidatura construída coletivamente e fortalecida por redes de conexão em todo o país, em diálogo com parceiras da América Latina, Caribe e África. O projeto vai além das fronteiras nacionais: o horizonte é ver mulheres negras liderando governos em todos os territórios possíveis, especialmente na “Améfrica”.
Para Naiara Leite, coordenadora executiva do Odara, o Conecta Latinas foi um espaço de articulação política potente e necessário para as mulheres do Sul Global. A presença de ativistas negras, indígenas e trans de diferentes países permitiu a construção de uma agenda comum de resistência e enfrentamento à violência política e à sub-representação nos espaços de poder.
“Foi um momento importante para refletir sobre a geopolítica a partir da ótica das mulheres negras, indígenas, trans. Neste sentido, conhecer e trocar sobre as estratégias de resistência, do enfrentamento da sub-representação política e da violência política que afetam diretamente as mulheres negras nos permitiu pensar como podemos nos fortalecer e construir juntas. Acredito que os debates e conexões em torno da Marcha das Mulheres Negras fortaleceram mais um passo na direção de construir uma agenda de luta transnacional para enfrentar os contextos políticos que têm nos retirado vida, participação e direitos e apontaram para que possamos imaginar, juntas, futuros de Bem Viver no Sul Global”, destaca a ativista do Odara.

As trocas possíveis contribuíram com esta reflexão, na medida em que o Conecta Latinas deu conta de tocar em uma das estratégias mais caras do movimento de mulheres negras, que é a articulação em rede. “Nós investimos nisso a partir do regional, com a Rede de Mulheres Negras do Nordeste; com o nacional, a partir da Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB); e com o territorial, junto a Rede de Mulheres Afro-Latino-Americanas, Afro-Caribenhas e da Diáspora (RMAAD). Então chegar em um espaço como esse e poder encontrar muitas das nossas parceiras de construção política é uma oportunidade de fortalecimento do rizoma ou ecossistema, mas também de ampliação e maior capilaridade, à medida que encontramos tantas outras, de diversos lugares que podem e estão na disposição de se aproximarem e tocarem o processo conosco” destacou Joyce Souza.
A REDE CRESCE E FORTALECE
O Conecta Latinas não foi o início das conexões entre as organizações, e sim a continuidade. Já que em maio de 2022 o Instituto Odara e outras organizações participaram do Encontro +Representatividade, em Recife-PE, com cerca de 60 iniciativas de apoio à candidatura de pessoas negras, quilombolas, indígenas e mulheres do Brasil, Equador, Chile, México e Colômbia, organizado pelo UpDate. Em outubro de 2023, o Instituto Marielle Franco, a Rede de Mulheres Negras de Pernambuco, o Instituto Odara, o Movimento Mulheres Negras Decidem e Coletivo Nzinga realizaram, no Rio de Janeiro, o Encontro Nacional de Iniciativas de Fortalecimento de Mulheres Negras e LBTQIA+ na Política. Bem como, impulsionadas pelo UpDate, participamos do comitê de construção do Encontro +Representatividade realizado em Salvador-BA em fevereiro de 2024.
Essas agendas, em especial, favoreceram o ecossistema e a conexão entre organizações que atuam no fortalecimento e ampliação da participação política de mulheres negras no Brasil. No último sábado, 24 de maio, com a oportunidade de mais um encontro, tais organizações foram mobilizadas pelo Odara para um espaço de construção com o objetivo de revisão dos processos acordados anteriormente e alinhamento das pautas prioritárias a serem construídas em rede: enfrentamento à Violência Política de Gênero e Raça e Defesa da Paridade de Raça e Gênero.
Um dos encaminhamentos acordados nesse encontro foi a retomada da Plataforma +Negras na Política enquanto produto principal das organizações articuladas, a ser fortalecida como instrumento de comunicação e disputa de narrativa; repositório para os materiais produzidos pelas orgs; e visibilidade do ecossistema forjado. Com o objetivo de, a médio prazo, tornar a Plataforma uma coalizão em defesa da participação política e protagonismo de mulheres negras em espaços de tomada de decisão.
Para além do contexto de articulação nacional, o Conecta Latinas nos provoca, assim como a RMAAD, a pensar a perspectiva de Amefricanidade proposta por Lélia Gonzalez no processo de aprimoramento do Projeto Pretas no Poder, de modo a nos desafiarmos a olhar para geopolítica do Sul Global e traçarmos, articuladas em rede, as estratégias de enfrentamento às opressões contra mulheres negras e as proposições de um sistema político e econômico a partir das mulheres negras, que seja o Bem Viver.
* Com contribuição de Joyce Souza
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