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Odara e Cedenpa encerram Ciclo de Formação para Incidência Política para o PNE com aula especial sobre a Lei 10.639/03

Uma jornada de reflexões e muitas trocas chegou ao fim com o encerramento do Ciclo de Formação Populações Negras e Educação – Incidência Política para o Plano Nacional de Educação (PNE 2024-2034). Desde março deste ano, educadores do Nordeste e Amazônia dedicaram-se a discutir e analisar os Eixos do PNE, à luz das necessidades e contribuições da população negra.

O encontro final, realizado na última terça-feira (11), contou com a aula especial “Populações Negras e Educação: revisitando a história da Lei 10.639/03”. As convidadas Eneida Maria D’Albuquerque, pedagoga e ativista do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa), e Valdecir Nascimento, historiadora, fundadora e integrante da equipe de coordenação do Odara – Instituto da Mulher Negra, compartilharam suas perspectivas sobre a implementação da Lei 10.639/03, que há 20 anos regula a obriegatoriedade do ensino de história e cultura afrobrasileira na educação, e discutiram como o PNE pode fortalecer essa legislação.

Eneida D’Albuquerque destacou a importância do encontro e de discutir a Lei 10.639/03 no contexto do novo PNE é fundamental para garantir que a educação brasileira reconheça e valorize as contribuições das populações negras. “A escola, como espaço amplo, deve adotar metodologias inclusivas para as relações raciais. Manter livros de autoria negra nas bibliotecas é fundamental”. A ativista ainda destacou a importância do PNE prever medidas de prevenção e combate às violências raciais nas escolas: “Não podemos ignorar as violências que marcam o ambiente escolar, como o racismo, que afeta a saúde mental dos estudantes em diversos âmbitos.”

Valdecir Nascimento abordou a educação como o maior eixo de produção e atuação do movimento negro no Brasil, destacando reivindicações históricas. “Desde a época do Teatro Experimental [do Negro] e da Frente Negra [Brasileira] vimos a necessidade de que as trabalhadoras domésticas tinham de ser alfabetizadas. No entanto, ao longo da história, várias leis proibiam o acesso de pessoas negras à educação no Brasil”.

Valdecir ainda destacou que a negligência do debate racial na educação contribui para a construção de imaginários sociais negativos sobre nós. “Esse imaginário vê negros apenas como cachaceiros, vagabundos, ou amantes de samba, nunca associando o povo negro à riqueza. Isso é resultado de uma educação que nega e continua a negar o protagonismo negro na história do país. Essa educação nos faz não gostar do nosso cabelo, da nossa boca, do nosso corpo, porque as referências nas escolas não são negras ou indígenas”.

A ativista ainda destaca a relação do racismo com a permanência de estudantes negros na escola. “A evasão escolar também é consequência dessa falta de referências que dialoguem com a história do povo negro no Brasil.”

Para a engenheira de produção e especialista em Direitos Humanos, Relações Étnico-Raciais e Saúde, Jessyca Sampaio, que acompanhou o Ciclo de Formação, a experiência foi fundamental para promover trocas valiosas. “Para mim foi a oportunidade de conhecer e ouvir mulheres negras em suas diversas realidades, compartilhando desafios e estratégias que culminam na garantia de direitos e melhoria da qualidade de vida das populações negras. Assim como compreender e criar articulações para que o Plano Nacional de Educação possa ser aplicado com equidade a esta parcela da população.” 

Dirceu do Socorro Pereira, mestre em Cultura, Memória e Desenvolvimento Regional pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB e professor da Rede Estadual de Ensino na Bahia, que compôs a equipe de facilitação do Ciclo, enfatizou a relevância do evento e importância da criação de novos caminhos e propostas que realmente atendem às necessidades no cenário da educação, das comunidades quilombolas, periféricas e de várias regiões do país. 

“Foram momentos de grande reflexão sobre as questões que atravessam a educação e os interesses das Populações Negras, onde se construiu novos caminhos e propostas que verdadeiramente contemplem as necessidades e especificidades das comunidades quilombolas, das comunidades periféricas, das comunidades tanto dos centros como dos interiores deste país.”

Dirceu ainda parabenizou a condução do Ciclo: “Para mim o aspecto relevante desses ciclos foi a participação direta de educadores e educadoras que estão comprometidas com um projeto de educação que construa novos aprendizados a partir da história e cultura do povo preto e fortaleça as bases de uma educação para as relações étnico-raciais e antirracista”, declarou. 

Durante estes três meses, o Ciclo de Formação Populações Negras e Educação se tornou um ambiente de identificação e acolhimento de experiências comuns entre professores e professoras. Kátia Maria Barbosa, historiadora e escritora, compartilhou suas impressões sobre a importância desse espaço e o impacto do ciclo na luta por uma educação inclusiva e justa.

“Percebi nesse ciclo que não estamos sozinhas(os) e que todo o processo de luta e aprofundamento do conhecimento precisa estar atrelado a um processo de aquilombamento. Um ambiente educacional com a presença de uma comunidade, especialmente negra, precisa ser antes de tudo um local que abrace as nossas subjetividades e proporcione ferramentas que levem a garantia dos nossos direitos”, destacou Kátia.

PNE EM PAUTA 

Os encontros do Ciclo de Formação Populações Negras e Educação  e do debate sobre o PNE foram construídos a partir dos resultados do Seminário População Negra e Educação, que aconteceu em novembro de 2023 em Brasília, e das mobilizações em torno do acompanhamento do documento final. 

A ativista e educadora Maria Malcher acredita que a formação terá um impacto direto de médio e longo prazo, e seus resultados podem apoiar a tomada de decisões para o enfrentamento às desigualdades sócio-raciais e de gênero que persistem há décadas no Brasil, especialmente na Amazônia e no Nordeste.

“Acerca do acompanhamento do cumprimento das metas do PNE, tanto o Cedenpa, quanto o Odara, apostam na construção de um plano estratégico de acompanhamento e monitoramento, alinhado e fortalecido a partir da Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola, a PNEERQ. É urgente, de fato, implementar ações e programas educacionais voltados à superação das desigualdades sócio-raciais e de gênero dentro e fora da escola.”

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