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#OpiniãoOdara: Minirreforma eleitoral e a ameaça à participação política da maioria sub-representada

Por Redação Odara

O sistema político brasileiro, predominantemente masculino, branco e heteronormativo, tem historicamente excluído uma vasta parcela da população. Nos últimos anos, vimos um crescente número de candidaturas e eleições de mulheres negras, travestis, membros da comunidade LGBTQIAP+, jovens negres, indígenas e outros grupos sub-representados. Apesar deste crescimento, o número de deputados brancos no Congresso Nacional, após as eleições de 2022, continua sendo mais que a metade da casa. Enquanto os autodeclarados pardos são 107 e pretos são 27, os autodeclarados brancos são 370. Foram eleitas 91 deputadas federais negras, o que representa apenas 8% da Câmara dos Deputados, sendo a maior representação de mulheres pretas ou pardas da história do parlamento brasileiro.

A Câmara dos Deputados concluiu na última semana a votação dos projetos da minirreforma eleitoral, que agora seguem para o Senado. Apesar de ser denominada “mini”, a reforma abrange uma série de alterações significativas e de impacto, sobretudo para as “maiorias silenciadas”, parafraseando Lélia González. As mudanças vão desde o uso do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), até as regras de prestação de contas e a cota feminina de 30%. As mudanças agora nos lançam a uma sombra sinistra sobre as pequenas conquistas dos movimentos sociais, Movimento Negro, Movimento de Mulheres Negras, movimento LGBTQIAP+, e índigena, nos fazendo questionar em alto e bom tom: A quem realmente serve essa reforma?

O primeiro projeto de lei (PL 4438 de 2023), que trata das mudanças gerais da reforma, foi aprovado com 367 votos favoráveis, 86 contrários e uma abstenção no dia 13 de setembro. Já o segundo projeto de lei complementar (PLP 192 de 2023), que aborda as regras relacionadas ao prazo de inelegibilidade, foi aprovado com 345 votos favoráveis, 45 contrários e uma abstenção no dia 14 de setembro. O que expressa de forma gritante o nível de comprometimento das representações políticas com o retrocesso.

As mudanças da minirreforma trazem preocupações significativas sobre os direitos das mulheres e a representatividade das chamadas minorias representativas nas eleições municipais de 2024, sinalizamos aqui algumas delas. Em primeiro lugar, chamaremos atenção para a proposição referente às cotas para as mulheres: contabilizar o mínimo exigível de 30% de candidaturas femininas por federação, em vez de por partido, diminuindo a representatividade feminina na política. Para nós, mulheres negras, que já enfrentamos desafios adicionais por conta do sexismo e racismo na política e na sociedade, políticas afirmativas como estas são ferramentas para combater as desigualdades e promover a diversidade no cenário político. É revoltante a tentativa de mudança das regras, quando aparentemente estamos avançando no campo da disputa por equidade.

A proibição de candidaturas coletivas também representa um golpe na busca por uma política mais inclusiva. Já que esses coletivos, coletivas, mandatos e mandatas dialogam diretamente com nossas comunidades, desempenhando um papel crucial ao visibilizar pautas silenciadas pelo sistema político. As candidaturas coletivas também têm sido uma importante estratégia para que mulheres negras diversas unam suas forças políticas e, consequentemente, ampliem a possibilidade de se elegerem aos cargos pleiteados. Ao proibí-las, a minirreforma eleitoral estará minando uma das poucas ferramentas disponíveis para aqueles que desejam construir uma política mais inclusiva.

As mudanças na forma como as campanhas políticas prestam contas e na redução das punições para aqueles que cometem infrações durante as eleições são preocupantes. Isso porque essas alterações podem tornar o processo eleitoral menos claro e mais propenso à corrupção. Se aprovada, essa decisão nos mostrará um sistema político enfraquecido, onde as regras não são rigorosas e as punições não são duras com corruptos.

Outro ponto de tensão é a questão das “sobras eleitorais”. A proposta aprovada determina que apenas os partidos que atingiram o quociente eleitoral poderão participar das sobras, regra que privilegia os mais votados e que já elegeram deputados na primeira rodada. Hoje, quem tem 80% do quociente pode participar das sobras. Para nós, isso significa que mesmo que nos mobilizemos para eleger os nossos, na maioria das vezes, faremos a força para influenciar na eleição de que os políticos com mais recursos e os partidos maiores sejam ainda mais privilegiados.

Seguindo a mesma linha de retrocessos que dificultam o acesso e participação política das maiorias sub representadas no que diz respeito à representação política no Brasil, está tramitando na Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que desobriga os partidos políticos de quaisquer punições ou multas relacionadas às irregularidades na prestação de contas dos recursos das últimas eleições. O texto da PEC da Anistia também prevê a diminuição de recursos para candidatas negras e negros, perdão para partidos que não repassaram recursos para candidatas mulheres e candidatos negros, e abre precedentes para que os partidos indiquem apenas homens como candidatos nas próximas eleições. Proposta pelo deputado Antonio Carlos Rodrigues (PL-SP), a PEC deve ser votada na próxima terça-feira (26).

Olhando para os dados atuais, vemos que a presença de mulheres negras no Congresso Nacional é significativamente baixa, o que torna essas reformas ainda mais preocupantes. Nossa maior preocupação neste momento é a velocidade com que a minirreforma está sendo tramitada. As mudanças nesse jogo de poder político podem significar o retrocesso em pautas caras para o Movimento Negro Brasileiro e para o Movimento de Mulheres Negras.

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