Caravana da Marcha das Mulheres Negras mobiliza território da Chapada Diamantina por Reparação e Bem Viver

*Por Brenda Gomes | Redação Odara
Com vozes firmes, música, memórias e esperança, a Caravana da Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver chegou à cidade de Seabra, na Chapada Diamantina, reunindo dezenas de mulheres negras de diferentes comunidades da região. O encontro, realizado no último sábado, 7 de junho, no Instituto Federal da Bahia (IFBA) (, campus Seabra, foi mais uma etapa de mobilização rumo à Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, que acontecerá em 25 de novembro de 2025, em Brasília (DF).
Durante todo o dia, mulheres e meninas das comunidades quilombolas de Agreste, Cutia, Vão das Palmeiras, Basílio, Vazante, Conceição, Bateias, Baixão Velho, Cerca de Pedra , Olhos d’Águinha e Mulungu se encontraram para fortalecer a luta contra o racismo, por Reparação Histórica e pelo Bem Viver.
A programação contou com rodas de conversa, mesas intergeracionais e momentos de escuta ativa. Amanda Oliveira, liderança jovem quilombola e ativista do Instituto Odara, destacou a urgência do debate construir estratégias coletivas diante das desigualdades que atingem de forma brutal as mulheres negras:
“Quando a dificuldade chega, ela bate primeiro na porta das mulheres negras. Estamos aqui para alinhar estratégias e pensar que nação queremos construir. Reparação e Bem Viver não são ideias distantes, são necessidades do agora. Não dá para falar em direitos e não falar sobre as lutas de nossas comunidades.”
Lorena Cerqueira, ativista do Odara, relembrou os marcos de 2015, quando milhares de mulheres ocuparam Brasília, na Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, destacando a dimensão internacional que a mobilização tem ganhado em 2025. Com a articulação do Comitê Global da Marcha das Mulheres Negras, já são mais de 29 países envolvidos na construção coletiva por Reparação e Bem Viver.
“Vivemos um cenário político marcado por retrocessos e perdas constantes de direitos. Diante disso, as mulheres negras ao redor do mundo têm se organizado, resistido e sonhado juntas. Por isso, é fundamental refletirmos: quem queremos levar para a Marcha? Como vamos nos articular para que essa mobilização seja, de fato, coletiva, enraizada e transformadora?”

A juventude também ocupou um lugar de protagonismo na Caravana do Território da Chapada Diamantina. Tainá Maria, de 15 anos, da comunidade quilombola Olhos d’Águinha, em Boninal (BA), foi uma das mediadoras da mesa intergeracional, que promoveu o diálogo entre diferentes gerações de mulheres negras. A mesa contou com a participação da também jovem Gabriela Pereira, de 17 anos, da comunidade quilombola Cutia, no mesmo município. Gabriela trouxe reflexões potentes sobr
e a importância da Marcha como espaço de denúncia, mobilização e afirmação de direitos.
“A Marcha é importante porque reúne mulheres negras de várias comunidades, para que a gente tenha visibilidade e possa exigir aquilo que sempre nos foi negado. Muitas vezes dizem que o que pedimos é demais, será mesmo? Eu fico assustada quando ouço que o racismo acabou… Não acabou, ele está presente. Lutamos para conquistar direitos, para correr atrás do que nos tiraram. Será que tudo aquilo que dizem que é para nós chega, de fato, nas nossas comunidades? Por isso acho justo que a gente lute, marche e chegue a lugares que antes pareciam inalcançáveis”, destacou Gabriela.
EDUCAÇÃO, MEMÓRIA E LUTA
Educadoras populares e lideranças comunitárias trouxeram pautas centrais para o debate na Caravana, como o acesso à educação de qualidade, o direito à moradia e a valorização dos saberes ancestrais. Claudiana Santos, pedagoga da comunidade de Vazante, chamou atenção para a necessidade urgente de reparar desigualdades históricas ainda presentes no cotidiano das comunidades negras:
“Reparação é pensar no que nos faltou e no que ainda nos falta. É sobre dignidade, direito à moradia, à liberdade. Houve um tempo em que a escola nos foi proibida. Hoje temos cotas porque muita gente lutou por isso. Esse avanço precisa ser reconhecido, respeitado e ampliado.”
A força da sabedoria ancestral também esteve presente na fala de Maria Efigênia, moradora da comunidade quilombola de Conceição, que emocionou o público ao relembrar sua trajetória de aprendizado e resistência:
“Tudo que eu aprendi não foi por leitura, foi pela vontade da minha mente. Estou aqui para representar minha comunidade. A juventude precisa seguir o rastro da nossa luta, que aconteceu mesmo sem sabermos ler e escrever. Precisam aprender a história da nossa terra, dos nossos remédios, das pessoas que ajudaram a subir a nossa comunidade .”

Carmelice Rosa da Silva, representante da comunidade quilombola do Agreste, destacou o papel da mobilização como ferramentas para gerar impacto real nos territórios:
“A gente começa a lembrar o que tinha antes e a perceber o quanto a luta coletiva movimenta as coisas. É com organização e movimento que conseguimos construir iniciativas que tragam resultados concretos para as nossas comunidades. A gente se fortalece acessando políticas públicas, muitas vezes via editais, e isso também é reparação.”
CAMINHOS ATÉ BRASÍLIA
A Caravana é uma estratégia de mobilização territorial que tem como objetivo escutar, envolver e articular mulheres negras em suas próprias comunidades, fortalecendo suas vozes e demandas. Essa metodologia foi utilizada na construção da primeira Marcha das Mulheres Negras, em 2015, e está sendo retomada em 2025 como ferramenta essencial para garantir uma Marcha ampla, popular e profundamente conectada com os territórios.
O encontro em Seabra foi um marco de mobilização profunda e territorializada, onde cada fala reforçou que a reparação não é apenas uma pauta histórica, mas uma urgência cotidiana.
A Caravana também contou com o debate sobre a Carta da Marcha de 2015, documento histórico que reúne as diretrizes políticas construídas pelas mulheres negras do Brasil, e com oficinas voltada para meninas, adolescentes e jovens do projeto Ayomide Odara e da Escola de Ativismo e Formação Política para Mulheres Negras Beatriz Nascimento (EBN) , fortalecendo o protagonismo juvenil na luta contra o racismo, sexismo e LBTfobia.
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