Assine o Boletim Odara:



Escola Beatriz Nascimento inicia 7ª turma convocando “anônimas guerreiras brasileiras” para a construção da 2ª Marcha Nacional das Mulheres Negras 

Uma noite para ficar na história das mulheres da Escola de Ativismo e Formação Política para Mulheres Negras Beatriz Nascimento (EBN)! Assim foi a aula inaugural da 7ª turma da EBN, que aconteceu na noite da última quarta-feira (24). O encontro virtual contou com a presença de mais de 60 mulheres, que se reuniram para escutar relatos da construção da Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, que aconteceu em Brasília, em 2015.

O encontro iniciou com a acolhida de Lorena Cerqueira, coordenadora da Escola Beatriz Nascimento, que ressaltou a relevância do momento para as organizações de mulheres negras do Brasil. “Este momento representa uma oportunidade única para fortalecermos nossas vozes e reafirmarmos nosso compromisso com a luta pelos direitos das mulheres negras em nosso país”, afirmou Lorena.

No momento, também foi exibido parte do documentário “O Negro da Senzala ao Soul (1977)” , onde a própria Beatriz Nascimento examina a experiência da escravidão no Brasil, destacando as diferentes formas de resistência adotadas pelos africanos escravizados e seus descendentes, incluindo quilombos, revoltas e estratégias de preservação da cultura africana. O documentário pode ser acessado clicando aqui.

Como o objetivo da 7ª turma da Escola Beatriz Nascimento é a preparação das  participantes para contribuírem ativamente na construção da 2ª Marcha Nacional de Mulheres Negras, que acontecerá em novembro de 2025, em Brasília, o primeiro encontro do ciclo foi um momento de escutar atentamente e aprender com aquelas que construíram a primeira Marcha Nacional de Mulheres Negras, reconhecendo suas experiências, desafios e conquistas. 

O bate-papo contou com a participação de Naiara Leite, coordenadora Executiva do Odara Instituto da Mulher Negra; Maria Malcher, ativista do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa); e Valdecir Nascimento, coordenadora de Captação de Recursos e Articulação Política do Odara; que além de relembrarem a trajetória de contrução do primeiro ato, também fizeram provocações importantes às cursistas da EBN. 

Valdecir Nascimento compartilhou sobre os sonhos coletivos e os desafios enfrentados durante a construção da primeira Marcha de Mulheres Negras. “Nós fizemos uma marcha sem dinheiro público. Foi um desafio, mas nós superamos. Fomos nós, do Nordeste e do Norte, que pegamos essa marcha e dissemos: vamos fazer. Muita gente não acreditava, foi trabalhoso, difícil, mas conseguimos. Tiramos cartas de cada reunião de organização, para mostrar que, independente de quem viesse, nós estávamos indo e sabíamos onde queríamos chegar”, destacou. 

A partir de uma análise dos últimos dez anos, Maria Malcher destacou os avanços pós-marcha na sociedade civil. “A organização do próprio movimento de mulheres negras é extremamente propositiva. Antes da marcha, estávamos espalhadas, e isso representa um avanço importante. Outro aspecto relevante é considerar a multidimensionalidade que a marcha alcançou; através do nosso movimento, nós demonstramos o modelo da nação brasileira que desejamos.”

ANÔNIMAS GUERREIRAS BRASILEIRAS

Naiara Leite, coordenadora executiva do Instituto Odara, iniciou sua participação cantando o verso “África liberta em suas trincheiras. Quantas anônimas guerreiras brasileiras”, parte da música considerada um hino para o movimento de mulheres negras, destacando a fundamental presença das anônimas brasileiras na construção da marcha de 2015. 

“Em meio a uma crise já anunciada no Brasil, a Marcha Nacional das Mulheres foi pensada por mulheres diversas, que enfrentavam desafios em seus próprios territórios, que a gente nem consegue imaginar, dada a dimensão que esse movimento tomou. A marcha é um movimento das guerreiras anônimas cujas histórias muitas vezes são invisíveis. Um movimento que provou que a marcha não tem donos ou donas, sendo um movimento coletivo e inclusivo que representa a diversidade e a força das mulheres brasileiras”, declarou. 

A ativista também destacou a sua percepção após uma década desde a realização da marcha, enfatizando a magnitude do movimento e seu impacto transformador na sociedade brasileira. “A luta das mulheres negras precisa ser autônoma, uma autonomia real sem ter que baixar a guarda. É o princípio que garante a nossa luta. Nós conseguimos perceber, 10 anos depois, que mostramos um movimento de mulheres negras que nunca foi visto no Brasil. Tivemos mais mulheres do que as que estavam em Brasília; tivemos várias que não conseguiram estar lá, mas estavam conectadas conosco, que construíram essa marcha em seus territórios”, afirmou Naiara.

A RADICALIDADE DAS MULHERES NEGRAS 

As provocações e relatos das participantes mobilizaram as cursistas, que permaneceram participativas durante o encontro, mesmo com o avançar das horas.

Iansmin Gonçalves, ativista do Instituto Odara,  compartilhou sua emoção ao pensar na responsabilidade de construir a segunda marcha, destacando a necessidade de enfrentar a ascensão da extrema direita de forma eficaz. “Eu não fui na marcha de 2015, mas me lembrei das mobilizações que foram feitas no Recôncavo [da Bahia]. Acabei me emocionando muito pensando na responsabilidade que teremos na construção deste movimento, no compromisso que temos com as nossas mais velhas e nossas mais novas. Fiquei reflexiva ao pensar nas estratégias  para fazer o enfrentamento à extrema direita.”

Rita Ribeiro, do Movimento de Mulheres Cegas e com Baixa Visão (MBMC), durante o encontro provocou o grupo a pensar sobre a necessidade de visibilizar as mulheres negras que são portadoras de deficiência. “Se as mulheres negras são invisibilizadas, as mulheres negras com deficiência sequer são mencionadas. Estou aqui para tentar mudar isso, para construir outras narrativas. Acho que estamos no melhor lugar para trazer essa provocação e fazer com ela chegue até outras mulheres com deficiência”, destacou.

Lays Araujo, integrante das Blogueiras Negras e da Rede de Mulheres Negras do Nordeste, abordou a questão do financiamento da marcha, enfatizando a importância do apoio financeiro coletivo para garantir a participação de mulheres de todas as regiões. “O dinheiro das instituições vai para o Sul e Sudeste do Brasil. Precisamos pensar como a gente pode fazer o nosso autofinanciamento, ou um financiamento coletivo. Não é responsabilidade das organizações, é uma responsabilidade de todas nós, para que a gente possa levar mais mulheres, sobretudo mulheres que não estão nessa linha de visibilidade. Espero que sejam muitas mulheres do Norte e Nordeste para a gente levar as nossas pautas.”

PERFIL DA TURMA 

Nesta edição da Escola Beatriz Nascimento foram selecionados 70 cursistas,  de 10 estados das regiões Nordeste e Amazônia. A maior número das cursistas são da Bahia (33,8%), seguidas pelas alunas do Tocantins (19,7%) e pelas representantes do Rio Grande do Norte (8,5%). Das selecionadas, a maioria tem entre 30 à 35 anos (29,6%), são ligadas a religiões de matriz africana (49,3%) e se definem como mulheres pretas (76,1%).

Assine o Boletim Odara:



Compartilhe:

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *