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Menina de 11 anos grávida por estupro pela segunda vez e quatro mulheres assassinadas em cinco horas: O que está acontecendo no Piauí?

O estado apresenta dados alarmantes envolvendo estupros de vulneráveis e homicídios de mulheres

Em Teresina (PI), uma garota de apenas 11 anos teve a segunda gravidez confirmada, um ano após dar à luz pela primeira vez. Ambas as gestações são fruto de estupro cometidos por familiares e, nas duas situações, a família da menina não autorizou a realização do aborto. 

A garota, que agora vive em um abrigo, já havia engravidado em janeiro de 2021 – quando tinha apenas 10 anos – após ser vítima de estupro cometido por um primo de 25 anos. Dessa vez, o estupro foi praticado por um tio, que dormia no mesmo quarto que a menina. O crime está sendo investigado e o suspeito continua em liberdade. Desde a primeira gravidez, a menina deixou de frequentar a escola e se recusa a receber atendimento psicológico.

Ao negar a autorização do aborto, a mãe da menina violentada, alegou que “aborto é crime”. No entanto, pela lei brasileira, o procedimento é permitido em três situações específicas: gravidez decorrente de estupro, risco de morte para a grávida e anencefalia do feto. Deste modo, caso decidisse por realizar o aborto, mãe e filha estariam legalmente resguardadas pelas duas primeiras condições legais para tal: a gravidez é fruto de violência e põe em riscos a vida da menina.

O que, então, estaria por trás da não autorização? Falta de informação? Moral cristã? Medo de julgamento? Talvez um pouco de cada coisa. Embora o aborto realizado em casos de gravidez por estupro esteja previsto em lei, existe uma corrente conservadora no Brasil – muito motivada por preceitos cristãos – que culpabiliza e julga como imoral, pecadores e criminosas, meninas e mulheres que optam ou necessitam fazer um aborto. Esse tipo de pensamento vem ganhando ainda mais força desde 2018, com o governo Bolsonaro e seus ministérios, cujas medidas ameaçam ainda mais os direitos sexuais e reprodutivos de meninas e mulheres brasileiras, sobretudo negras das regiões Norte e Nordeste.

Também no Piauí, na última sexta-feira (9), entre às 17h e às 22h, foram registrados quatro homicídios cometidos contra mulheres. Duas das vítimas eram menores de idade. Salustriana Vieira da Silva, de 33 anos, Rosângela Fernandes Pereira, de 52, Emily Hellen Alves de Moura, de 16, e Maria Camila Dias Medeiros, de 17, foram mortas nas cidades de Paes Landim, Luís Correia, Valença e Parnaíba, respectivamente. Nos casos de Salustriana e Emily, os suspeitos são seus ex-namorados das vítimas e os crimes apontam para indícios de feminicídio.

O que está acontecendo no Piauí?

O Piauí tem apresentado números preocupantes no que diz respeito aos casos de estupro, violências e homicídios praticados contra mulheres nos últimos anos. 

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, o estado registrou um aumento de 18% no número de ocorrências de estupro de vulneráveis, saltando de 719 em 2020 para 848 em 2021. Atualmente, o Piauí soma 1.521 processos em tramitação envolvendo estupro de vulneráveis, como aponta o Painel de Monitoramento de Processos Relacionados a Estupro de Vulnerável.

Entre 2019 e 2021, o estado somou 96 casos de feminicídio, superando a média nacional, segundo levantamento do Observatório de Segurança Pública.

Sabemos ainda que a realidade da recorrência dos casos é ainda muito mais alarmantes que os números registrados, e invariavelmente subnotificados pelas lógicas familiares, religiosas, cristãs, que atuam em defesa da dignidade e liberdade dos homens agressores, e revitimizam as meninas e mulheres, principalmente em casos de violência sexual.

O que está acontecendo com o estado do Piauí e com o Brasil que prega “defesa da vida” para incidir contra o “direito ao aborto” de uma menina, criança de 11 anos, que já engravidou e pariu vítima de um estupro, e revive em menos de um a mesma dor e trauma, praticada novamente por um homem da sua família?

Que pensamento cruel perpassa uma nação, uma comunidade, uma família, que não consegue proteger as meninas negras e pobres de terem suas vidas esfaceladas pelo machismo, racismo e pobreza? O que faz com que homens adultos se sintam no direito de interromper a vida de meninas, crianças, de suas famílias, torturá-las e estuprá-las? Por que tantos homens se sentem donos das vidas de ex namoradas e ex companheiras, que decidem acabar com relacionamentos abusivos, e por isso estes ceifam as vidas delas?

Quem se incomoda com as notícias de violências e de mortes de meninas e mulheres negras, vítimas do patriarcado?

Como o racismo e a pobreza influenciam na ocorrência dessas violências?

A mãe da menina que ficou grávida duas vezes em decorrência de estupros, por exemplo, está desempregada e sobrevive com uma renda fixa de R$600,00 proveniente do Auxílio Brasil. 

Pensar a segurança e a garantia dos direitos das mulheres, passa também pela garantia de renda para assegurar uma vida digna, independente do domínio e da violência masculina, e pelo acesso aos espaços de poder e tomada de decisão, através dos quais será possível a criação de políticas integradas para combater a ocorrência de crimes sexuais e crimes contra suas vidas.

O que pode estar acontecendo no Piauí é que grande parte das mulheres não possuem acesso a recursos materiais que lhes permitam viver em segurança e estão submetidas a uma cultura política patriarcal e sexista, que naturaliza as violências e lhes impede de decidir sobre suas próprias vidas.

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