Mulheres Negras da Bahia realizam a primeira reunião do Comitê Impulsor para a Marcha por Reparação e Bem Viver – 2025
Por Brenda Gomes | Redação Odara
A noite da última segunda-feira (18) foi marcada por emoção, resistência e organização coletiva. Na data que celebra os nove anos da histórica Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, que reuniu 100 mil mulheres negras em Brasília, ocorreu a primeira reunião do Comitê Impulsor da Bahia para a Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver – 2025.
Com casa cheia, o encontro foi um espaço de reencontro, trocas intergeracionais, denúncias e fortalecimento da luta das mulheres negras da Bahia. Participaram do encontro mais de 30 organizações, que foram recebidas com as boas-vindas dadas de Sueli Santos, ativista da Rede de Mulheres Negras da Bahia, que na oportunidade rememorou a construção da Marcha de 2015, que se deu por meio das caravanas e reuniões, trazendo à tona a importância de reviver essas práticas para 2025, mas com um foco ainda mais forte nas questões centrais que atravessam a luta das mulheres negras.
“É importante que a gente, dessa vez, a gente retome a discussão acerca da reparação. Nós vamos a Brasília, tratar de Reparação e Bem Viver. É um mote importantíssimo, nós precisamos fazer esse debate acerca da reparação. Precisamos exigir do governo brasileiro a reparação histórica que nos é devida. E nós, mulheres, vamos, mais uma vez, retomar a política do movimento negro, trazendo essa pauta”, disse Sueli.
Valdecir Nascimento, ativista e coordenadora de captação de recursos e articulação política do Instituto Odara, destacou que a formação de comitês, estratégia utilizada em 2015, está sendo replicada para a próxima marcha. Esses comitês, organizados em níveis municipais, estaduais e regionais, reforçam a mobilização para 2025, com o objetivo de reafirmar a luta contra as injustiças históricas e construir um projeto de nação que rejeite as violências geradas pelo colonialismo.“Esse é o grande desafio, e só nós mulheres negras, que somos hoje um sujeito político reconhecido, é que pode fazer isso. Por isso que nós queremos marchar no dia 25 de novembro de 2025. Por isso que nós queremos um milhão, porque cem mil agora não dá mais, cem mil dava em 2015. Agora nós precisamos de um milhão. Por tudo que aconteceu, Lula subiu a rampa com o Menino Preto, vocês viram, vocês têm a fotografia da subida de Lula no 1º de janeiro. Tudo mentira, palhaçada de Lula. Por que em seguida ele abriu a boca e disse que o problema do Brasil é que não tem pessoas negras para dirigir esse país, para ocupar a casa de decisão desse país”, destacou Valdecir.
A pauta central da mobilização da marcha de 2025 destaca a Reparação e o Bem Viver. A Reparação visa conscientizar a sociedade sobre os impactos e legados da escravidão e do racismo patriarcal, defendendo mudanças estruturais que promovam igualdade e justiça racial e gênero. O conceito de Bem Viver, por sua vez, rejeita modelos exploratórios, opressores e discriminatórios, e propõe uma convivência harmônica, onde o respeito à dignidade humana e ao meio ambiente sejam prioridades.
DENUNCIANDO AS VIOLÊNCIAS
A reunião também foi um espaço para ecoar denúncias. Além das trocas e reflexões profundas, diversas mulheres trouxeram à tona as dores e resistências que atravessam a vida das mulheres negras no Brasil. Renilda Silva, Associação Papo de Mulher, destacou as violências que insistem em cercar essas mulheres. “Eu estou muito cansada dessa realidade. Quando não é marido ou namorado que nos matam, é a polícia. Quem nos defende?”
Dona Mira, coordenadora do Movimento Sem Teto da Bahia (MSTB), aproveitou o espaço para denunciar o genocídio cotidiano enfrentado pela população negra. “Continuam nos matando na cara dura. Até quando? Quando vai acontecer uma luta forte se muitas pessoas se acovardam? Todo dia se mata um, dois, três de nós… fora os encarcerados. Somos nós, por nós mesmas”, desabafou.
Essa autossuficiência ecoou também nas palavras da ativista da Rede de Mulheres Negras da Bahia e Ialorixá do Ilê Axé Ibá Lugan, Jacira Miranda, destacou o tamanho da luta frente aos resultados insuficientes das reparações históricas. “Quando eu vejo as dores das minhas companheiras eu fico estarrecida. É tanta luta para pouco resultado. A reparação que queremos, que acreditamos, não veio como deveria vir, quando vem é aquela fatia de bolo fininha. Minha dor é grande, mas a minha fé ainda é maior.”
Por fim, as jovens negras também foram representadas, a partir das considerações feitas por Maria Felipe Estrela, mulher trans, estudante de serviço social e membro do movimento Pop Rua, apontando para as injustiças estruturais que atingem as comunidades periféricas.
“Ceifam todas as nossas oportunidades a partir da desculpa da ‘guerra às drogas’, mas na verdade a polícia chega na periferia para nos matar. A juventude negra quer ter a oportunidade de viver. As crianças negras querem ter o direito de brincar nas ruas. Eles têm a máquina, mas a gente tem o movimento. Movimento é ancestral. E é em movimento que vamos colocar um milhão em Brasília”, destacou Estrela.
PRÓXIMOS PASSOS DO COMITÊ DA BAHIA
Naira Leite, ativista e coordenadora executiva do Instituto Odara, encerrou o primeiro encontro das mulheres da Bahia fazendo uma contextualização sobre como estão se organizando os comitês para a Marcha. Além disso, rememorou os passos já dados pelas mulheres negras nesse processo de construção: como o lançamento da Marcha de 2025, que ocorreu em março deste ano; e a reunião aberta nacional que aconteceu em Brasília, em maio, quando foi identificada a necessidade de estruturar os comitês estaduais, regionais e nacionais, promovendo uma troca de experiências e estratégias entre os estados.
“Os encontros do comitê têm um papel importante nesse processo, pois nos permitem sistematizar de que forma a estrutura do Bem Viver será construída e compartilhada por nós. É também um espaço para reflexão sobre o que as mulheres negras brasileiras querem apresentar em 2025. Não é apenas uma questão de organização logística para estar na marcha, mas compreender que nossa presença em Brasília é uma afirmação política indispensável. A marcha não é apenas local; ela é uma convocação global. Nossa meta vai além de reunir um milhão de mulheres negras em Brasília, queremos fazer essa mobilização um chamado para o mundo”, afirmou Naiara.
A reunião do Comitê Impulsor da Bahia foi um importante marco para a construção da Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver – 2025. Com palavras fortes, vozes diversas e estratégias bem definidas, as mulheres negras seguem unidas, reafirmando que a luta pela justiça é urgente e inegociável. Os próximos passos dessa jornada serão definidos na próxima reunião do comitê baiano, que acontecerá 30 de novembro, com local ainda a definir.
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