Mulheres Quilombolas e ativistas do Instituto Odara realizam Jornada Pela Vida das Mulheres Negras nos Territórios do Oeste e Sudoeste Baiano
Entre os dias 4 e 11 de abril de 2024, nas regiões do Oeste e Sudoeste da Bahia, aconteceu a Jornada Pela Vida das Mulheres Negras, uma iniciativa promovida pelo Odara – Instituto da Mulher Negra, em parceria com lideranças quilombolas locais. Essa agenda acontece desde abril de 2023 e já foi realizada nos territórios Baixo Sul; Litoral Sul; Recôncavo e Chapada Diamantina. Desta vez, os encontros foram realizados em seis cidades dos territórios Velho Chico e Sertão Produtivo, reunindo aproximadamente 400 mulheres, entre 18 e 75 anos.
O propósito central desta Jornada foi fortalecer as lideranças e mulheres quilombolas da região em geral, na luta por participação política e enfrentamento às diversas formas de violência que assombram suas vidas. Por meio dos projetos “Pretas no Poder: Participação Política, Representatividade e Segurança de Ativistas Negras” e “Quilomba – Pela Vida das Mulheres Negras”, as mulheres quilombolas, estudantes, professoras, servidoras públicas se uniram em diversas atividades.
Joyce Lopes, coordenadora dos projetos Quilomba e Pretas no Poder, explica que a Jornada é um momento de aproximação da organização com as comunidades e suas vivências. “Essa é uma agenda que nos revitaliza, o próprio nome expressa seu sentido. É quando podemos conversar mais próximas sobre nossas realidades, falar sobre passado, presente e futuro, na expectativa de projetarmos os próximos passos da nossa parceria na incidência contra as violências, e também traçarmos estratégias para tomarmos para as mãos das mulheres negras o poder de decisão a partir da ocupação de cargos eletivos.”
Os encontros contaram com a participação de representantes de 41 comunidades quilombolas, dos municípios de: Bom Jesus da Lapa, Paratinga, Serra do Ramalho; Sítio do Mato; no oeste e no sudoeste: Carinhanha; Igaporã; Malhada; Riacho de Santana; Caetité; Lagoa Real; Palmas de Monte Alto; Pindaí e Anagé.
Para Valéria Porto, liderança do Quilombo Pau D’arco e Parateca, no município de Malhada, Território Velho Chico, a Jornada foi um momento crucial de fortalecimento comunitário. Ela expressa a esperança de que as atividades realizadas durante a Jornada continuem unindo as mulheres e as incentivem a participar ativamente nos processos de tomada de decisões em suas comunidades.“Foi um momento de construção e fortalecimento com as mulheres dos territórios quilombolas. Esperamos que com as atividades possamos seguir juntas fortalecendo nossas vidas e também conquistando os espaços de poder.”
Juliana Vaz, coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação da Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e moradora da comunidade quilombola de Araçá, município de Cariacá, ressaltou a relevância do evento como ferramenta de fortalecimento das lutas em torno das questões de gênero e raça na região. “Foi um momento de fortalecimento político de reafirmação dos princípios da nossa luta em torno das questões de gênero e raça. Entendemos esse espaço como ferramenta de fortalecimento das nossas lutas em torno do Oeste da Bahia, vai vir muita coisa fruto deste processo.”
AVALIANDO O PERCURSO
As discussões sobre violência política de raça e gênero, violência doméstica e familiar, e a sub-representatividade nos espaços de decisão foram abordadas com franqueza e coragem. Cada mulher trouxe consigo uma bagagem única de experiências e desafios, contribuindo para um diálogo rico e plural.
Naiara Leite, coordenadora executiva do Instituto Odara, ressaltou como o contexto de violência e violações estruturado pelo racismo patriarcal impacta diretamente as comunidades negras, tanto em áreas urbanas quanto quilombolas. A luta pelo direito à terra e a preservação da história e memória acentuam a insegurança das mulheres quilombolas, colocando-as em situações de risco e vulnerabilidade diante de diversas formas de violência.
Neste sentido, destacou Naiara: “A Jornada pela Vida das Quilombolas é estratégica para fortalecer a luta dos territórios quilombolas, a luta por direitos, a luta pela participação e pela vida. São contextos de luta que necessitam ser potencializados. São contextos de violências diversas que precisam ser cada vez mais denunciados. Estamos irmanadas para enfrentar juntas todas as opressões e ameaças que nos atravessam”.
Rosa Belém, professora da Rede Estadual de Ensino do Município de Carinhanha, também participou das discussões e destacou a importância da construção de agendas em torno das temáticas. “Embora nosso município seja muito rico, nós somos muito impactados pelas violências. Violências que atingem diretamente as mulheres negras e periféricas das nossas comunidades. Esse encontro foi fundamental para a construção de uma nova agenda para potencializar essas mulheres a saírem deste lugar que tem nos sufocado e silenciado.”
Marilúcia Souza da Silva, liderança quilombola do Largo de Santana, do município Riacho de Santana, expressou a necessidade de formação e informação sobre as questões das mulheres, vislumbrando esse momento como o primeiro de muitos que virão para mudar a realidade. “Esse encontro aconteceu em um momento muito importante, onde as mulheres de Riacho de Santana têm a necessidade de formação e informação sobre as questões da mulher. Eu espero que esse momento seja o primeiro de muitos que venham acontecer, precisamos de conhecimento para ir mudando nossa realidade”, afirmou.
Para Iansmin Gonçalves, assistente técnica dos projetos Quilomba e Pretas no Poder, a Jornada Pela Vida das Mulheres Negras é um momento de renovação, de reencontros com os territórios e renovação do compromisso com a continuidade da luta. “ A aproximação com as mulheres e lideranças do territórios, através do projeto Quilomba, nos faz refletir como a gente pode contribuir para o processo de incidência política das comunidades, que já têm uma trajetória política muito grande. Se tratam de territórios que já fazem as discussões e debates das temáticas, estamos juntas a elas para somar nessa discussão.”
Norivalda Lopes da Silva Santos, professora quilombola da Rede Municipal de Riacho de Santana, por sua vez, enfatizou a importância das contribuições das mulheres negras para a transformação da sociedade, especialmente no campo político. “Elas trouxeram uma contribuição muito rica a cerca dessa sociedade que a gente vive e que é muito marcada pelo patriarcado. As contribuições foram muito bem-vindas principalmente no campo da dimensão política. É uma luta que a gente acredita que podemos vencer devagar, mas que a gente já está acreditando nos avanços. Esse encontro de formação é essencial para a gente ter mulheres fortes e atuantes, não só no espaço da família, mas também em todo lugar.”
Diolinda Silva de Jesus, liderança quilombola de Duas Lagoas, em Riacho de Santana partilhou o seu sentimento de aprendizado e inspiração, levando consigo novas ideias para sua comunidade: “Aqui tem sido aprendizagem uma com as outras, fomos muito tocadas. Vamos sair daqui com muito aprendizado para colocar em nossas comunidades.”
Ananias Joana, presidente da Associação de Remanescentes do Quilombo Urbano Largo da Vitória, localizado em Riacho de Santana, também partilhou a satisfação dos encontros. “Essa Jornada veio como presente para a nossa cidade, vai fortalecer as nossas mulheres. Foi um momento de muitas trocas e fortalecimento de todas as nossas lutas enquanto mulheres negras quilombolas.”
Ao percorrer os diferentes territórios, a Jornada revelou histórias de luta e resiliência. As vozes das mulheres negras ecoaram, reivindicando seu lugar de direito na sociedade. Foi um momento de reconexão com as raízes, de celebração da cultura e da identidade negra, e de fortalecimento dos laços comunitários.
Para Inês Brito, do Quilombo Tomé Nunes, do município de Malhada, no território Velho Chico, a Jornada foi um momento de fortalecimento comunitário. “Tivemos um grupo de mulheres, quase do município todo, ouvindo a palestra, isso é muito importante para nós. Espero que esse momento nos ajude a ver melhor e a sonhar melhor, sonhar até mesmo na área da política. Malhada é muito carente de mulheres em cargos políticos, de forma geral, imagine cargos ocupados por mulheres negras.”
Durante os encontros também foram estabelecidos encaminhamentos concretos. Entre eles, destacam-se o apoio a lideranças comunitárias para o desenvolvimento de projetos e acesso a recursos; a realização de audiências públicas para efetivação de denúncias e controle social das políticas públicas; e o suporte a candidaturas de mulheres negras quilombolas.
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