Coluna Beatriz Nascimento #9 – 3ª Temporada: Raissa Rocha
Carta para Beatriz Nascimento e todas as moças da EBN
Lembro do primeiro dia como se fosse ontem. Valdecir Nascimento, mulher que admiro, mulher espelho, falando de forma escura e coesa: “O que é empoderamento? Esqueçam essa palavra.” Lembro do meu espanto e dos dias de reflexões sobre tudo o que sou e tudo que eu acredito. Lembro – e nunca esqueço – das mulheres da GRUMAP, que me atravessam de maneira avassaladora. Rita Santa Rita, Ritinha, matriarca, mulher potente que me resgata em cada olhar, cada palavra e cada abraço. Lembro o quanto falar sobre maternidade me tocou: Quero ser mãe? O que é isso de planejamento de vida? E a paternidade? Ufa… calma, eu só tenho 21 anos. Calma!
A Escola Beatriz Nascimento me ensinou o poder e a importância de ter calma e paciência comigo, com meus processos, com o meu existir… às vezes o desespero bate, a ansiedade toma conta de mim, mas hoje já consigo respirar e me acolher. Não é fácil, mas sinto que já passou da hora de tomar as rédeas do meu caminho, passou da hora de ser dona do meu próprio destino e isso eu aprendi com a EBN.
Foram três meses e me parece que foram anos de aprendizado. Sou grata a cada mulher que passou pela minha vida durante esse processo, sou grata a cada mulher que se permitiu “trocar” comigo e sou imensamente grata a Dayse Sacramento. Cada palavra que ela jogava para o vento chegou até mim de maneira certeira. Retornei para cada início das minhas falas onde eu sempre afirmei que a oralidade e a escrita não eram o meu forte e lembrei do quanto isso ainda me afeta e mexe comigo. Chorei. Chorei, pois é extremamente doloroso o que o racismo fez comigo e foi ouvindo a Dayse que eu percebi que isso tem que acabar. Óbvio que em todos os encontros eu fui arrebatada de alguma forma, mas creio que nesse do dia 29/07/2023 eu finalmente percebi que preciso ser dona do meu caminho e não posso deixar ninguém falar por mim.
Na EBN eu reaprendi a chorar! Sim, havia me esquecido como se chora e eu LITERALMENTE chorei em todos os encontros. Eu nunca tinha vivenciado isso de maneira tão intensa. Já fui em alguns encontros de mulheres, roda de conversa, mas eu nunca me senti tão pertencente e entregue. Eu fiz parte da 5° turma da Escola Beatriz Nascimento, em 2023. Eu vi o brilho no olhar de cada mulher que ali estava e eu fui uma dessas mulheres. Ninguém irá tirar isso de mim, pois sinto que nunca mais serei a mesma.
Sou cria do Projeto Axé, em 2020 o Em Cantos do São Lázaro me convidou para fazer parte de sua família como coordenadora e secretária e desde então os projetos sociais vêm me resgatando. Sou o que sou por conta do coletivo, por conta da causa social, por conta da junção de mulheres pretas que se unem para juntas construírem um futuro melhor e por isso tenho certeza de que a força e a chave estão em nossas mãos. Somos nós que fazemos a gira girar e a EBN só surgiu em minha vida para comprovar isso.
Sou grata a Oyá pelo vento bom que foi esse processo, sou grata a minha mãe Lindaura Conceição por sempre estar comigo e acreditar quando mais ninguém acreditou, sou grata à EBN por ter me escolhido e por me permitir escolher e sou imensamente grata a todas as mulheres que passaram por esse quilombo. Eu nunca me esquecerei de vocês.
Gratidão Beatriz Nascimento por ter sido espelho motivacional para fazer essa escola acontecer. Gratidão eterna!
Somos pulsantes, somos pensantes, somos insubmissas e inconformadas. É o “ser” que segue fazendo a gente alcançar lugares inimagináveis. Sigamos mais fortes que nunca, mirmãs.
*Raissa Rocha é educadora e coordenadora do “Projeto Em Cantos de São Lázaro”, mediadora cultural da CCB (Casa do Carnaval da Bahia), produtora cultural, dançarina arteira, escritora e graduanda em BI de Humanidades pela UFBA. Cria de projeto social e filha de muitas que abriram caminho, Raissa segue movimentando a cultura e educação de sua comunidade seguindo passos ancestrais e focando no coletivo.