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Relatora da Comissão Interamericana de Direitos Humanos se reúne com representantes de movimentos sociais em Salvador

Representantes de movimentos sociais e grupos da sociedade civil estiveram reunidos na última quinta-feira (15) com a Relatora Especial sobre Direitos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Soledad García Muñoz, no Espaço Cultural dos Alagados, no bairro do Uruguai, em Salvador (Ba).

O encontro teve como objetivo escutar as denúncias de violações de direitos dentro das  comunidades e grupos representados, já que o  CIDH é o órgão principal da Organização dos Estados Americanos (OEA), encarregado da promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano. 

O encontro começou com a saudação aos presentes e a recepção da fundadora e coordenadora de Captação de Recursos e Articulação Política do Odara – Instituto da Mulher Negra, Valdecir Nascimento, que falou sobre a importância  da atividade. “O que estamos fazendo hoje é um momento histórico. Estamos garantindo que vamos ser escutados por uma representante de uma organização que pode dar ainda mais visibilidade às violências que perpassam por nossas trajetórias”.

A visita da relatora da CIDH ao Brasil foi organizada pelo Instituto  Washington Brazil Office – WBO, e na Bahia, contou com a parceria do Odara –  Instituto da Mulher Negra, da Organizações em Defesa dos Direitos e Bens Comuns (ABONG), do Centro de Arte e Meio Ambiente (CAMA), do Instituto Cultural Steve Biko e do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRANS).

Durante a visita, a relatora Soledad García falou da importância de ouvir os movimentos sociais brasileiros e compreender os contextos que vivem as comunidades. “Nesta visita fomos acolhidos por muitas instituições, que se juntaram conosco para apresentar as realidades existentes no Brasil. Eu estou aqui para escutar o que vocês tem para dizer. Nosso trabalho é de escuta para fazer os encaminhamentos possíveis”, afirmou. 

EM MARCHA PARA GARANTIR DIREITOS

Thiffany Odara, ativista do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRANS), utilizou o espaço para denúnicar as violências vividas pelas pessoas transsexuais e a inexistência de políticas públicas que possam garantir a existência dessas pessoas. 

“A gente não consegue entender os atos coloniais contra os corpos trans. Somos um dos lugares que mais mata pessoas trans no mundo. E para além de pensar esquerda e direita, o Brasil não tem um plano de ação, uma política de Governo que fomente a redução dessas violências, que nos colocam à margem e sem garantias de direitos”, apontou Thiffany.

O enfrentamento à violência contra as mulheres e a deficiência do sistema de justiça para garantir a segurança de mulheres que são vítimas de  violência de gênero e da violência doméstica e familiar foi um ponto destacado pela advogada e ativista Letícia Ferreira, da ONG Tamo Juntas. 

“Precisamos de uma série de leis e políticas públicas que possam garantir a vida das mulheres que são vítimas de violência. Muitas vezes essas mulheres quando denunciam seus agressores ficam desassistidas, não possuem dinheiro para se locomover ou se alimentar, se sentem mais expostas do que seguras. Tudo isso, porque temos um sistema que ainda opera negligenciando a proteção concreta da vida das mulheres”, declarou a advogada. 

EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE

Joilson Santana, membro do Centro de Arte e Meio Ambiente – CAMA, aproveitou o evento para relatar sobre os impactos das mudanças e desastres climáticos nas comunidades negras. Para ele, a busca das soluções precisam ser apontadas pelas comunidades impactadas.

“A população negra é quem mais sai prejudicada quando acontecem os eventos climáticos e crimes ambientais, isso tem nome, e é fundamental que seja discutido como racismo ambiental climático. Essa agenda para a gente é muito cara, e queremos recomendar a relatora que as organizações responsáveis possam buscar soluções construídas junto com a gente, homens e mulheres negras, na mesa de discussão. É preciso considerar que nós somos parte da solução do problema que a gente não causou”, afirmou Joilson. 

As violências vividas pelas famílias do território de Ilha de Maré também foram denunciadas durante o evento. A comunidade vem sofrendo com os impactos ambientais causados pela atuação de empresas nestes territórios. Moradores da comunidade da Boca do Rio, localizada na Baía de Aratu, em Candeias (BA), também relataram situações de negação de direitos e violações a seu território e à saúde da comunidade.

Na oportunidade, a coordenadora dos projetos de enfrentamento a violência contra mulher do Instituto Odara, Joyce Souza, entregou a “Carta das Águas”, documento que é fruto do projeto “Sou das Águas”, desenvolvido com 50 mulheres, marisqueiras e quilombolas da comunidade de Santiago do Iguape, do município de Cachoeira (Ba). A carta tem como objetivo, por meio de uma agenda pública e política, dar visibilidade à falta de planejamento e execução das Políticas Públicas voltadas às mulheres da comunidade.

PELA VIDA DAS CRIANÇAS E JOVENS NEGROS

O extermínio da juventude negra também foi uma das pautas do encontro. A advogada do projeto “Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar” do Instituto Odara, Lorena Pacheco, na oportunidade apresentou os dados de atendimento do projeto, que tem acompanhado as mães e famílias de jovens assassinados em decorrência da violência do Estado. Lorena também lamentou a demora no julgamento dos casos.  

“Hoje, infelizmente, a gente veio denunciar o Estado brasileiro, o estado da Bahia, que tem ceifado a vida da nossa juventude negra. Queremos denunciar a violência processual, pois não é possível que um pai, ou uma mãe, passem mais tempo lutando para ter justiça, do que ele passou com seu filho em vida”, declarou Lorena. 

Nesse mesmo tom de denúncia, Joel Castro, pai de Joel Conceição Castro, teve a vida interrompida por uma bala disparada por um policial militar, quando tinha apenas 10 anos de idade,  no bairro do Nordeste de Amaralina, utilizou o espaço para pedir atenção ao caso que tramita há quase 13 anos.

“A caminhada é muito dura, são 12 anos tentando levar esses homens (policiais) para júri. As pessoas me perguntam se eu ainda acredito na justiça dos homens, eu digo que eu acredito na luta, porque eu preciso lutar pela memória do meu filho. Joel só tinha 10 anos, uma criança. Alguém precisa fazer alguma coisa para que esses casos sejam punidos”, desabafou.  Saiba mais sobre o caso clicando aqui

A relatora da OEA, Soledad García Muñoz, diante da apresentação dos casos afirmou que há “necessidade de um olhar antirracista, sobre os casos apresentados Pois não são casos isolados. São casos que se repetem o tempo todo”, lamentou. 

ENCAMINHAMENTOS 

Ao final da agenda, a relatora Soledad García Muñoz almoçou com os catadores de materiais recicláveis integrantes do Fórum Estadual Lixo e Cidadania da Bahia e do Movimento Nacional dos Catadores/as de Materiais Recicláveis da Bahia para tratar das violações de Direitos Humanos.

Após o encontro, Soledad seguiu para o Quilombo Rio dos Macacos e deixou como recomendação a construção de um documento coletivo, para direcionar o trabalho do CIDH. “Por favor, esse é o início de uma relação que não pode ficar por aqui. Enviem dados, informações para que o CIDH possa entender as realidades de cada um, para que possamos trabalhar e construir soluções”, finalizou Soledad. 

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