PELA AUTONOMIA DO MOVIMENTO DE MULHERES NEGRAS – O JULHO DAS PRETAS É NOSSO

Salvador, 30 de Julho de 2015
Exma. Sra
Vera Lúcia Barbosa
Secretária de Promoção da Igualdade do Estado da Bahia – Sepromi
Prezada Senhora
Assistimos estarrecidas e reflexivas a forma abusiva como a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Bahia (Sepromi) se apropriou indevidamente da marca e história de construção do “Julho das Pretas” na Bahia. Sabemos que o governo tem autonomia para criar suas próprias marcas e chamadas baseadas nas políticas públicas que é da sua competência implementar, a exemplo, do Carnaval Ouro Negro, do Março Mulher, do Novembro Negro e do Agosto da Igualdade. Contudo, devemos deixar demarcado quais são os limites do Estado e do movimento social. Isso é imprescindível não confundir.
É fundamental que os limites sejam respeitados. A Sepromi não tem o direito de se apropriar da marca, história e agenda do “Julho das Pretas” como se fosse parte integrante dos programas desta secretaria. Até porque, as demandas e as necessidades das Mulheres Negras no estado da Bahia clamam por respostas urgentes – violência contra a juventude, moradia, violência das mais diversas, trabalho, educação, etc. – o Estado precisa alterar esta realidade.
O Odara – Instituto da Mulher Negra é uma organização negra e feminista fundada em agosto de 2010. O elemento mobilizador do Odara está voltado para a inclusão das mulheres negras no ciclo de desenvolvimento do país. Cumprir tal proposito pressupõe: mapear e analisar a situação de desigualdades em que vive as mulheres negras; desenvolver estratégias de inserção das mulheres negras nas políticas públicas; fortalecer o controle social e seu empoderamento político.
Nesse sentido, o Odara e o Movimento de Mulheres Negras vem ao longo desses anos construindo relações, arranjos institucionais e diálogos com vista a apresentar a sociedade as ideias, práticas cotidianas e as tecnologias desenvolvidas por nós, mulheres negras e que ora vemos serem usurpadas por outros setores. Dentre as estratégias que vem sendo desenvolvidas por nós para demarcação de espaço político na sociedade baiana e no Nordeste temos reafirmado nossas identidades, criado marcas e estratégias de visibilidade, que se diferencia na luta do movimento social, a exemplo, da “Vigília das Pretas” pelo fim da violência contra as Mulheres Negras; “Mulheres Negras na Lavagem do Bonfim” e o “Julho das Pretas”. Ou seja, o Movimento de Mulheres Negras tem desenvolvido “estratégias de guerrilha” para fazer o enfrentamento antirracista, antisexista e antilesbofobico, que articulados aprofundam o fosso das desigualdades que nos atinge diretamente. Além de ser uma tática de promoção da incidência política das mulheres negras.
O “Julho das Pretas” é uma agenda comum de intervenção criada pelo Odara – Instituto da Mulher, em 2013, que além de discutir a programação de atividades e ações de mulheres negras para o mês de julho, quando se comemora o dia 25 de Julho – Dia Internacional da Mulher Afro-Latino-Americana e Afro-Caribenha, se propõe a debater amplamente as problemáticas e prioridades das intervenções no estado. Este ano, em sua 3ª edição o “Julho das Pretas” se tornou uma agenda local e nacional do Movimento de Mulheres Negras no Brasil, com foco a reforçar as ações de mobilização pró-Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e Pelo Bem Viver, que acontecerá em Brasília, no dia 18 de novembro deste ano.
Para manutenção da autonomia do movimento social de livre criação e desenvolvimento das suas ações e estratégias é necessário que o governo não confunda o seu papel que é de implementar a política pública de promoção da igualdade e de garantia de direitos, enquanto o movimento social deve continuar o seu papel de denuncia contra o racismo, o sexismo, a lebofobia e cobrar a garantia de direitos.
Com este documento reafirmamos a necessidade de respeito com as organizações e com o movimento de mulheres negras, assim como, solicitamos que a referida secretaria retire de circulação todo e qualquer documento e material denominado “Julho das Pretas”. Nós, do Odara – Instituto da Mulher Negra, como idealizadoras do “Julho das Pretas”não autorizamos a associação da nossa marca as atividades do poder público, caso contrário adotaremos as medidas cabíveis para assegurar nossos direitos. O fato da Sepromi e demais secretarias de governo apoiar ações do “Julho das Pretas”não é requisito para que estes órgãos públicos se apropriem de forma indevida e desrespeitosa da nossa marca.
O “Julho das Pretas” pode e deve ser apropriado pelo movimento de mulheres da Bahia e do Brasil como tem acontecido nos últimos anos. O movimento de mulheres negras da Bahia e do Brasil clamam por autonomia, liberdade, pelo fim do racismo, da violência e pela promoção do bem viver para todas.
ODARA – INSTITUTO DA MULHER NEGRA
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