Quem se lembra do “Menino Joel” (10)? Capoeirista, garoto-propaganda do governo do estado, morto pela Polícia Militar da Bahia em 2010

Em julgamento histórico, policiais acusados pela morte do menino vão a júri popular a partir do próximo dia 6 de maio

Redação Odara

Em 2010, o menino Joel Conceição Castro, de apenas 10 anos, já se destacava por seu desempenho e paixão pela capoeira, seguindo os passos do pai, Seu Joel, com quem compartilhava também o mesmo nome. Cheio de sonhos e com um futuro promissor pela frente, o menino chegou a protagonizar uma propaganda televisiva do Governo do Estado da Bahia.

Muito carinhoso e apegado ao pai, o garoto tinha como meta proporcionar uma boa vida para a própria família. “Eu não tenho palavras para falar de Joel. Agradecia a Deus todos os dias pelo filho que me deu. Ele era inteligente, comunicativo e querido por todos. Ele era encantável”, lembra o pai, que é também conhecido como Mestre Ninha, por seu trabalho de décadas dedicadas à capoeira.

A vida e os planos do menino Joel, no entanto, foram interrompidos por uma bala disparada pelo braço armado do Estado. Era noite de domingo, dia 21 de novembro de 2010, e a Polícia Militar realizava mais uma das suas ações no bairro Nordeste de Amaralina. Seu Joel voltava da igreja por volta das 22h e, encontrando seus três filhos na porta de casa, mandou que todos entrassem por conta do horário. O menino Joel e seus dois irmãos, ambos mais velhos, obedeceram o pai, que acreditava estar garantindo a segurança dos filhos ao guardá-los dentro da sua própria casa. Alguns minutos depois, a família foi surpreendida com o barulho de rajadas de tiro. O menino, que estava próximo à janela do quarto se preparando para dormir, foi atingido por um tiro na cabeça.

“Eu estava forrando a cama e ouvi um baque no chão. Quando olhei para trás, estava meu filho caído. Saí correndo desesperado, gritando por socorro e quando abri a porta, a rua estava cheia de policiais com armas apontadas para mim”, conta seu Joel. Segundo o pai, os policiais negaram socorro ao menino, que foi levado ao hospital por um vizinho, mas não resistiu aos ferimentos. 

Morria Joel, o menino da capoeira, o garoto carinhoso de 10 anos que não desgrudava do pai e sonhava em lhe dar orgulho. 

Menos de um mês depois, o laudo do Departamento de Perícia Técnica (DPT) comprovou que o disparo que atingiu o menino foi feito pelo soldado Eraldo Menezes de Souza. O policial alegou que o tiro foi acidental. No início de 2011, o inquérito referente ao caso foi encaminhado ao Ministério Público (MP-BA), que passou a ser o órgão responsável pela apuração do crime. Eraldo e o tenente Alexinaldo Santana Souza, que comandava a operação policial, foram acusados de homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e impossibilidade de defesa da vítima. 

13 anos de espera por justiça

Só agora em 2024 o processo finalmente se encaminha para a etapa de julgamento dos réus, por meio de júri popular, que será iniciado no dia 6 de maio, às 8h, na sala principal do júri do Fórum Ruy Barbosa, em Salvador (BA), podendo se estender pelos dias seguintes. Para apoiar os familiares e pedir justiça pelo menino Joel, haverá um ato público na frente do Fórum antes do início do júri. A manifestação é mobilizada por outros familiares de vítimas do Estado e ativistas de movimentos sociais.

São 13 anos de espera por esse julgamento, tempo maior que os 10 anos vividos pelo menino Joel. “Que eles [os policiais] paguem pelo que eles fizeram, porque Joel só queria viver dentro da residência dele e não conseguiu”, desabafa o pai do garoto.

O Odara – Instituto da Mulher Negra atua como assistência de acusação do Ministério Público no caso, através de sua assessoria jurídica, vinculada ao Minha Mãe Não Dorme Enquanto Eu Não Chegar – projeto da organização que há 9 anos atua no acolhimento, fortalecimento social e jurídico de mães e familiares de vítimas do Estado, em Salvador. Confira na íntegra a Nota Jurídica do Odara sobre o caso.

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