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Victor Cerqueira, guia turístico de 28 anos, foi morto durante operação conjunta entre as polícias Civil, Militar e Federal em Caraíva (BA)

Por Adriane Rocha – Redação Odara


No último sábado (10), Victor Cerqueira Santos Santana, de 28 anos, conhecido carinhosamente como Vitinho, foi assassinado durante uma operação policial conjunta das polícias Civil, Militar e Federal na comunidade ribeirinha de Caraíva, distrito de Porto Seguro, na Bahia. O jovem trabalhava como guia turístico em uma pousada local, e era muito querido por moradores e visitantes.

Segundo  o coronel PM Luís Alberto Baqueiro Paraíso Borges, a operação tinha como objetivo prender um homem conhecido como Alongado, acusado de liderar uma organização criminosa. Segundo a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA), houve confronto e dois homens foram mortos: o líder do tráfico e um “segurança”, que seria Victor.

A família, no entanto, contesta essa versão e afirma que Victor foi confundido com outro homem, também apelidado de “Vitinho”. Nega qualquer envolvimento dele com atividades ilegais e denuncia a execução sumária. De acordo com os relatos da mãe, Luzia Cerqueira, e da prima, Jamile Cerqueira, Victor saiu para buscar hóspedes no rio, por volta das 17h. Quando notou a movimentação policial, conduziu os turistas a um local seguro e foi entender o que estava acontecendo. Foi visto ainda com vida, algemado, descalço, apenas de bermuda, por volta das 18h.

O corpo de Victor foi entregue ao IML às 3h da madrugada de domingo (11), já sem vida, com sinais de extrema violência: múltiplas fraturas no tórax, hematomas no rosto e na boca, uma perfuração de arma branca na costela que atingiu o coração e um tiro na jugular, de cima para baixo.

A mãe do jovem, Luzia Cerqueira afirmou em entrevista ao G1 que Victor foi levado pela polícia, e que só depois de algumas horas o seu corpo apareceu: O meu filho não foi morto em Caraíva, ele foi algemado e saiu algemado na frente de outras pessoas. Só foi chegar em Porto Seguro 3h da manhã, morto, com sinais de tortura. Pegou um menino inocente.”

O estado do corpo obrigou a família a antecipar o velório. “Nem o último adeus pôde acontecer com o cuidado que ele merecia”, escreveu uma amiga da família.

A defesa do jovem aponta que câmeras de vigilância da comunidade foram desligadas antes da operação e que os policiais confiscaram imagens de comércios locais, o que dificulta a apuração dos fatos. A falta de transparência e o apagamento de provas apenas reforçam a suspeita de uma execução planejada.

A declaração do comandante da operação que resultou na morte do jovem, coronel  Luís Alberto Baqueiro Paraíso Borges, foi usada para reforçar a versão de legalidade da ação policial, mesmo diante de indícios que levantam sérias dúvidas sobre sua condução. Segundo ele, Victor estaria armado e teria sacado a arma no momento da abordagem, o que justificaria o uso da força letal,  enquanto outro homem, também armado, foi apenas preso por não ter reagido. Ao afirmar que há um “jogo de informações” para desacreditar a polícia, o comandante tenta desqualificar qualquer questionamento e blindar a atuação da corporação: “Não vamos recuar porque estamos dentro da lei, cumprindo mandados”, disse.

O assassinato do Guia Turístico se soma a uma estatística que escancara a política de extermínio do povo negro no Brasil: a Bahia foi o segundo estado com maior taxa de homicídios de jovens em 2023, segundo o Atlas da Violência 2025. Foram 3.892 mortes de jovens no estado,  sendo 1.702 desses jovens mortos em ações policiais, uma taxa de 113,7 homicídios por 100 mil doze vezes mais que em São Paulo. A média nacional já é absurda: 45,1 por 100 mil.

Diante da brutalidade do caso, familiares, moradores de Caraíva e organizações civis realizaram um ato na última segunda-feira (12) exigindo justiça. Um abaixo-assinado já reúne mais de oito mil assinaturas e uma página nas redes sociais, @justicaporvitinho, foi criada para mobilizar apoio e reunir provas, relatos e indignação.

Mais um caso revela o modus operandi do Estado, mais um jovem negro é morto trabalhando.  A juventude negra quer viver. Vitinho queria viver. E nós não vamos aceitar o silêncio como resposta.

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