Viagem para a Península de Maraú (BA) marca encerramento do Projeto Ayomidê Odara

As meninas e adolescentes, que até então só se conheciam através das aulas e atividades virtuais, aproveitaram os cinco dias de lazer e atividades formativas
Por Jamile Novaes / Redação Odara
O Projeto Ayomidê Odara – Meninas e Adolescentes Negras enfrentando o Covid-19 na Bahia e Pernambuco tem por objetivo contribuir para o enfrentamento da violência racial e de gênero na comunidade e no ambiente escolar, a fim de possibilitar o acesso e permanência de meninas e adolescentes negras na escola após a pandemia. A ação é uma realização do Odara – Instituto da Mulher Negra e conta com o apoio do Fundo Malala, a Aliança Terre des Hommes Suisse e com parceria das organizações: Renascer Mulher (BA), Associação Alafunbi (BA), Associação Cultural Odeart (BA) e do Grupo de Mulheres Nativas (PE).
“O projeto surge a partir do momento que a equipe Odara percebe a necessidade de manter as meninas negras na escola pós Covid, já que muitas delas apontavam dificuldades nesse sentido. As oficinas servem para sensibilizar para a importância delas ocuparem esse espaço educacional que é a escola”, explica Érika Francisca, Coordenadora do Projeto.

As atividades do Ayomidê iniciaram em dezembro de 2020, oferecendo oficinas formativas centradas nos eixos da comunicação, direitos humanos, questão racial e de gênero para cerca de 100 meninas e adolescentes negras de 9 a 18 anos, divididas em duas turmas por faixa etária. Mesmo com algumas dificuldades, sobretudo relacionadas ao formato virtual das oficinas e incompatibilidade de horários, mais de 80 meninas concluíram o primeiro ciclo do projeto. Para evitar a evasão, Dai Costa, Coordenadora Pedagógica do Ayomidê e mãe de uma das alunas, afirma que o principal método utilizado foi o diálogo aberto com cada uma das meninas e suas famílias:
“A gente se deparou com muitos desafios no decorrer do projeto. Utilizamos de muitos métodos para garantir que elas continuassem no projeto, mas o maior deles foi o diálogo. Eu ia identificando as meninas que estavam há duas ou três aulas sem aparecer e mandava mensagem no privado. Todo o processo foi de muito acolhimento e cuidado com cada uma delas”, explica.

Como resultado do intenso processo formativo realizado durante o ano, as Ayomidês realizaram uma série de lives e lançaram o podcast “Ouça-me”, disponível na plataforma de streaming Spotify.
Construído a muitas mãos, durante todo o ano, o projeto contou com a colaboração das facilitadoras das oficinas, familiares, lideranças comunitárias, membros da comunidade em geral e funcionárias de instituições governamentais (Ministério Público, Defensoria Pública, escolas), que estiveram envolvidos direta ou indiretamente auxiliando as meninas em todas as etapas.
Ângela Maria de Oliveira, pedagoga e moradora de Lauro de Freitas, é tia de duas alunas do projeto. Ela afirma que, inicialmente, ela e suas sobrinhas não tinham muitas expectativas ou dimensão do que seria o projeto, mas que foram surpreendidas de forma positiva. Segundo ela, ao longo do processo, se construiu uma relação de confiança para com a equipe de coordenação.

“Eu percebi que existia uma comunicação bacana no grupo e isso é importantíssimo em qualquer projeto, em qualquer instituição. Fomos construindo uma relação de afetividade com o projeto, com o resultado das meninas. As vivências delas foram melhorando gradativamente”, explicou Ângela, que comentou ainda, estar à disposição da equipe para colaborar de forma contínua.
Para fechar o ano de forma celebrativa, as pequenas Ayomidês, que até então só haviam se encontrado de forma virtual, foram se conhecer pessoalmente e comemorar o sucesso do primeiro ciclo do projeto, na Península de Maraú, sul da Bahia. Uma programação de cinco dias foi montada com atividades de avaliação da trajetória coletiva e muito lazer. Estiveram presentes mais de 50 meninas e adolescentes de Salvador, Lauro de Freitas, Passagem dos Teixeiras (Candeias), Jequié e algumas comunidades quilombolas da Chapada Diamantina, na Bahia, Cachoeira e Pernambuco.
Em um discurso emocionado durante uma das atividades, Naiara Leite, Coordenadora Executiva do Instituto Odara, ressaltou que a viagem se configura também enquanto um ato político de troca de experiência e fortalecimento de meninas negras:
“Quero reafirmar que esse momento simboliza a luta de muitas mulheres negras que nos antecederam e que não vivenciaram, mas que dedicaram e dedicam suas vidas à luta contra o racismo para que nós possamos estar aqui hoje. Vocês são a continuidade de muitas e de muitas lutas, por isso, é necessário que aproveitem cada momento de troca, de discussão, de debate, de afeto e de fortalecimento das suas histórias e raízes”.

As meninas, acompanhadas pela equipe do projeto e de algumas mães e responsáveis, fizeram luau, passeio de barco, jantares e aproveitaram ao máximo tudo o que tinham direito durante o intenso final de semana na praia.
Para Beatriz Sousa, Educomunicadora e articuladora jovem do projeto, a viagem de encerramento foi como a realização de um sonho que demonstra o quanto meninas e jovens negras são grandes e poderosas quando estão juntas: “Ver todas aquelas Ayos orgulhosas de quem são é muito inspirador. Pra mim é comprovar que um futuro revolucionário nos espera, pra mim nenhuma outra sensação no mundo vai ser igual a essa”, disse emocionada.

Amanda Oliveira é uma liderança jovem quilombola, que faz parte do Instituto Renascer e foi mobilizadora das meninas do Subúrbio Ferroviário de Salvador e das comunidades quilombolas da Chapada Diamantina que participaram do projeto e da viagem. Ela ressaltou a importância de vivências como esta para as meninas que vêm do Quilombo: “Elas estão adorando! Tem muitas meninas lá com muito potencial, porém nenhuma oportunidade, e eu estar aqui e ter a chance de puxar as que estão lá para vivenciar esse espaço com mulheres como as mulheres que estão conduzindo esse processo, foi muito importante pra mim e tenho certeza que muito importante pra elas também”.

A diversão e os cuidados vivenciados pelas meninas também se estenderam para as suas acompanhantes e responsáveis, como comentou Ângela Maria: “Eu só tenho a parabenizar mesmo. Eu não tenho nem palavras pra expressar. E o cuidado com a gente enquanto mães também, enquanto tia. A gente teve muita atenção, muito cuidado, fomos muito mimadas”.

Apesar das fortes chuvas que atingiram a região sul da Bahia e chegaram a Maraú durante os primeiros dias da viagem, nada impediu que as meninas aproveitassem os seus poucos dias juntas: “No primeiro dia choveu e a gente ficou ilhadas. Nem parece, né? A viagem está sendo maravilhosa! A gente tá curtindo, mas com a tristeza de pensar que logo acaba tudo isso. Mas vai estar sempre no nosso coração”, afirmou Maria Eduarda Sena, aluna da turma 2 do Ayomidê Odara.
Ao final da viagem, as Ayomidês se despediram sob muitas lágrimas e a exigência de que o projeto tenha continuidade em 2022. Confira os registros dessa viagem inesquecível.












































































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